segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
Mário
Noite após noite, o ferreiro massacrava o ferro com o martelo. Julga-se um farol intermitente, uma sequência soluçada de imagens na parede, a luz do clarão que se esbate contra ele e atrasa-se a pintar na parede a sua sombra. Assim é o fardo de ser poeta, condenado a Hefesto, a que a parede revele a nossa lavoura sendo ela sempre a falta de luz, a nossa sombra, a nossa culpa, a nossa limitação. Levar a metáfora até as suas últimas consequências, selar com a nossa vida a nossa obra, fazer com que o clarão trespasse o nosso corpo, dando a toda a parede o leque das cores vivas, da carne; carnívoras portanto, carnívoras ao ponto de nos consumirem a carne, porque assim se canta o último poema, assim se escreve a tragédia, com o sangue, o nosso sangue, o drama em gente, o nosso drama, a nossa vida, a busca louca de quem sabe que não é Deus e que toda a obra apenas padece de autor. Esta é a linha, a fronteira, quem a transpõe sabe, deita o corpo na mesa, como que uma mulher que se entrega e espera.
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